“Dar voz a quem se sente oprimido”; leia entrevista com autor de livro infanto-juvenil

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Na edição de outubro da Revista Francisca, a reportagem intitulada “A teia da proteção”, de autoria da jornalista Marcela Güther, aborda os cuidados das redes de proteção de direitos do município em relação ao abuso e violência sexual infantil, além de falar sobre ações preventivas. Abrindo a reportagem, o escritor infanto-juvenil Tino Freitas, ganhador do prêmio Jabuti, comenta sobre o livro “Leila”. Confira a entrevista completa com o autor.

Como e quando você começou a escrever literatura para crianças?

Meu primeiro livro (“Cadê o Juízo do Menino?”, uma parceria com a ilustradora Mariana Massarani, editora Manati) foi lançado há 10 anos (2009), no Salão do Livro da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), no Rio de Janeiro.

Por que escolheu focar no público infanto-juvenil?

Desde 2006, trabalho como mediador de leituras junto a crianças, em um projeto chamado Roedores de Livros (em Ceilândia, DF). Acho que esse contato me aproximou do desejo de escrever. Com o tempo, descobri que gosto de pensar na ilustração como forma de dizer parte da história. Então escrevo o texto, alguém desenha. Nesse caso, a mídia para as minhas histórias é o livro ilustrado.

Como nasceu a ideia para “Leila”?

Leila nasceu da impressão que tive, ao visitar uma escola, que uma das crianças estava intimidada com algo que não conseguia traduzir numa conversa com os que ali estavam. Achei que precisava escrever para que os leitores (todos) pudessem se sentir donos de uma voz para dizer o que sentem, e também como uma forma de que possamos também perceber que é preciso ouvir o outro.

Como falar sobre um tema tão sério para crianças, e de maneira lúdica? 

Leila não é um livro lúdico. É um livro ilustrado que usa de metáforas, silêncios e o universo do maravilhoso, para contar com sensibilidade, profundidade e força um tema que muita gente prefere evitar falar com seus filhos e alunos. Esperamos com esses elementos consigamos alcançar leitores de todas as idades (o livro é indicado pela editora para leitores a partir de 8 anos). Mas você pode ler o livro e achar que Leila é sobre abuso sexual, ou sobre liberdade, ou sobre dar voz a quem se sente oprimido. Há que se deixar espaços para que o leitor perceba em que lugar cabe a leitura. E acho que Leila faz isso.

Você consultou profissionais para embasar a história? Como fez essa pesquisa pedagógica?

Não houve uma pesquisa pedagógica. Não pensei em envolver a escola. Se fosse pensar nisso, talvez desistisse de escrever essa história. Temas tabus como abuso sexual, morte, questões de gênero, entre outras, passam por um momento de seres escondidos pelos adultos, como se as crianças não precisassem saber sobre isso. Mas eu li muitas reportagens sobre o tema, conversei com pessoas próximas que passaram por essa situação, me aproximei do tema o quanto pude. Mas não pensando pedagogicamente. O principal desse livro é que ele foi pensado a seis mãos. E nesse caso, sim, vivemos longo processo de lapidação para transformar o que era um texto em 2015, quando a ideia nasceu, em um livro sensível e belo, em 2019.

A literatura, para você, pode fazer um papel preventivo sobre o tema? 

A literatura nos ajuda a comunicar com a gente mesmo, com o mundo. Reflete a humanidade. É por meio da arte, consequentemente da literatura, que podemos conhecer sentimentos que nem percebíamos nossos. Nesse sentido, sim, pode ser preventivo. Mas gosto de pensar que Leila não é um remédio, uma vacina, algo do tipo “tome essa vitamina para ficar forte”. Acho que Leila é um livro que emociona. E cada um faz o que quiser com o que isso lhe proporcionar.

Como foi o processo de criação em conjunto com a ilustradora Thais Beltrame?

Tivemos um ano para criar as ilustrações. E conversarmos detalhes como falar indiretamente sobre o lixo que o homem despeja nos mares (e onde o abusador mora). O antagonista, o Barão, é um polvo, com cinco tentáculos (um polvo, todos sabemos, tem oito tentáculos). Nosso personagem tem cinco, pois é uma metáfora: ele representa uma mão. E assim fomos conversando e trocando ideias, filmes, percepções. Ora ela sugeria suprimir ou mudar uma palavra do texto, ora eu sugeria algo nas ilustrações. Ora, ao ver uma das imagens, eu repensava o texto. Foi um intenso trabalho em conjunto. O livro é nosso. Em todos os sentidos.

Como foi a recepção da obra na Feira do Livro de Joinville?

Na Feira, o livro circulou mais pelos bastidores, emocionando colegas de trabalho, professores, algumas crianças. Ainda não tínhamos certeza se o livro ficaria pronto a tempo da Feira, e concentramos o trabalho prévio em outras obras. Mas deu para sentir que o interesse foi crescendo. Uma coisa boa. Um tema necessário de ser debatido em todos os lugares. A Feira de Joinville tem também esse perfil: oferecer aos seus frequentadores, uma conversa sobre temas os mais diversos, trazendo sempre o livro como instrumento de socialização.

 

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