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13/12/2019Escolas municipais de Itapoá ganharão prédios com salas de música
16/12/2019Simone Becker, arquiteta e urbanista, mestre e doutora em Engenharia de Transportes, é professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Joinville; o texto, exclusivo para Francisca, completa a reportagem sobre “Cidades Inteligentes” publicada na edição de dezembro
O termo “Cidade Inteligente” é amplo e complexo. Encontramos, na literatura, muitos trabalhos tentando conceituá-lo. Existem definições distintas e seus âmbitos de aplicação são variados. Pode-se afirmar que o investimento tecnológico está sempre presente, porém a tecnologia não é uma meta em si. Isso quer dizer que a tecnologia deve ser aplicada para melhorar a qualidade de vida da população, sempre com um conceito de sustentabilidade subjacente, e, para tal, a necessidade de coordenação e integração das diferentes instituições (públicas e privadas) e subsistemas urbanos.
Meu envolvimento com o tema está ligado ao planejamento da mobilidade urbana sustentável, minha área de pesquisa. Trabalho com ferramentas de análise de dados com foco em diagnósticos, prognósticos e simulação de políticas de mobilidade sustentável para analisar seus impactos a curto médio e longo prazo.
Do ponto de vista de obtenção de dados e informações, cada vez mais, a tecnologia está presente para gerar informações em tempo real. No entanto, estes dados devem ainda ser tratados e sistematizados. Em uma cidade inteligente e do ponto de vista da mobilidade, dados gerados pela população com uso de aplicativos variados devem retornar automaticamente para o usuário, visando ao melhor planejamento de suas viagens diárias, e para os órgãos da administração pública, para o planejamento tático e operacional dos sistemas de transportes e para o planejamento estratégico da mobilidade urbana. Hoje, algumas prefeituras estão tendo acesso, via acordos, aos dados do Waze e de aplicativos tais como 99Taxi. Porém, no caso do Brasil, essa informação não é tão direta. Requer muito tratamento de dados e desenvolvimento de ferramentas para que se obter informações úteis para análise. Outro aspecto é a necessidade de validação, confrontando com dados reais.
Ainda falando em obtenção de dados, podemos citar os que podem ser obtidos por equipamentos de controle de velocidade (pardais e lombadas eletrônicas) ou de controle semafórico. Esses equipamentos, além de captar os veículos acima da velocidade ou os que ultrapassaram o sinal vermelho, acumulam informações de contagens de tráfego 24 horas por dia, sete dias na semana. Informação valiosa para o órgão de planejamento de mobilidade urbana alimentar seus modelos de simulação e subsidiar suas análises do desempenho do sistema viário. No entanto, raramente retornam as informações aos órgãos públicos. E, quando retornam, não é em um formato de fácil análise. Requer tratamento moroso que dificulta o uso. Em uma cidade inteligente, o sistema deveria ter uma comunicação mais eficiente.
Do ponto de vista de políticas de mobilidade, podemos citar os sistemas inteligentes de transportes. Esses sistemas, baseados em tecnologia da informação, podem garantir a prioridade de modos de transporte mais sustentáveis. Por exemplo, semáforos inteligentes que dão prioridade ao transporte público. É claro que só a tecnologia digital não é suficiente. Deve existir toda uma infraestrutura viária de vias exclusivas adequadas à priorização do sistema de transporte púbico. A informação ao usuário, em tempo real, também é uma qualidade importante para o transporte público, o que pode ser obtido por GPS instalados nos veículos e transmitido ao usuário pela internet ou por aplicativos no celular.
Ainda em políticas de mobilidade sustentável, podemos citar as que incentivam a mobilidade ativa, com o compartilhamento de bicicletas. Nesse caso, a tecnologia aproxima o usuário desses sistemas, podendo visualizar, em aplicativos, a disponibilidade de bicicletas nas proximidades, e viabilizar a locação do veículo.
A chave é a integração
Voltando ao conceito, para uma cidade ser inteligente, não adianta ter uma ou outra medida adotada de forma isolada. A inteligência está na integração das medidas e retroalimentação das informações dos sistemas urbanos. No quesito mobilidade inteligente, deve ser um somatório de medidas planejadas e implantadas de forma integrada e que garanta mobilidade sustentável e acessibilidade de forma equitária, a toda a população, nas suas atividades diárias. O foco é melhor qualidade de vida e menor impacto possível sobre o ambiente natural.
Os novos paradigmas para o planejamento da mobilidade sustentável requerem análise integrada entre uso do solo e transportes, ou seja, integração das ferramentas de planejamento urbano e ferramentas de planejamento de transportes. Parte-se do pressuposto de que as intervenções nos sistemas de transportes causam impactos nos usos e ocupações do solo urbano (localização de empreendimentos residenciais e de negócios), e estes voltam a impactar os sistemas de transportes em função dos deslocamentos da população para acessar suas atividades diárias de trabalho, estudo, compras etc.
Neste sentido, o planejamento urbano e da mobilidade se tornou complexo, e para tal necessita de ferramentas de apoio à decisão, também complexas. Os modelos dinâmicos e integrados de uso do solo e transportes são ferramentas baseadas na dinâmica de sistemas. São capazes de fazer previsões a curto, médio e longo prazo (30 anos) de impactos gerados por diferentes políticas e medidas de transporte e de uso do solo. Os impactos são medidos em termos de distribuição espacial da cidade, emissões de poluentes, tempos gastos em deslocamento, escolha modal acessibilidade da população às atividades essenciais, entre outros. É o meu foco de pesquisa, com base no modelo Mars (Metropolitan Activity Relocator Simulator) desenvolvido na Universidade de Viena, na Áustria. Minha primeira aplicação foi para Porto Alegre, no âmbito da minha pesquisa de doutorado.
Estamos desenvolvendo, como projeto de pesquisa na UFSC, em parceria com a Secretaria de Planejamento Urbano e Desenvolvimento (Sepud), um modelo Mars para Joinville. É um trabalho complexo, pois requer uma quantidade expressiva de dados para alimentar e calibrar o modelo de forma que represente os subsistemas de transporte e uso do solo de Joinville. Portanto, acesso a dados é essencial para o planejamento da mobilidade com o uso de ferramentas tecnológicas de última geração. Quanto mais acesso a dados abertos, Big Data, maior a viabilidade de desenvolvimento das ferramentas de análise.
A próxima etapa é usar o modelo para ensino, pesquisa e extensão, permitindo que os alunos da Engenharia de Transportes e Logística simulem diferentes políticas de mobilidade para a cidade e avaliem seus impactos. Isso qualifica o ensino, pois os futuros engenheiros de transportes, enquanto aprendem, podem analisar a cidade onde moram e fornecer subsídios à prefeitura sobre as melhores alternativas de curto médio e longo prazo para a mobilidade urbana. A integração entre universidade e administração pública é essencial para promover ações relacionadas a cidades inteligentes.
Smart Mobility
A Sepud tem trabalhado com obtenção de dados do Waze e de fluxo de veículos provenientes dos radares de velocidade, em um projeto chamado Smart Mobility. O Smart Mobility visa aplicar dados e tecnologia à geração de inteligência em mobilidade, sendo composto por cinco fases: diagnóstico, estimativa de demanda, simulação, intervenção, além de monitoramento e acompanhamento.
Os dados são processados e cruzados com outras informações, como o SIMGeo (sistema de informações georreferenciadas do município), OpenStreetMaps (repositório aberto de informações cartográficas) e números de acidentes do Corpo de Bombeiros Voluntários de Joinville.
Quanto ao transporte público urbano de Joinville, que é um problema e vem perdendo usuários, recentemente, as empresas adotaram um projeto de melhoria, através do monitoramento por GPS dos veículos. A medida, além de fornecer informação ao usuário, em tempo real, quanto à chegada do próximo veículo a parada, será capaz de fornecer informações importantes sobre tempos e velocidades que servirão de subsídio para o planejamento do sistema.
Do ponto de vista da mobilidade urbana sustentável, temos muito que melhorar em termos de tecnologia de transportes e infraestrutura para garantir maior eficiência ao transporte público urbano. Além de investir em tecnologia e infraestrutura para maior incentivo aos meios de transportes ativos.